sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Na cabeça de Mano Brown

"Os herois estão presos", diz Mano Brown em show com ingressos a R$ 200.
Isso em Dezembro de 2010, em plena ação da polícia carioca e invasão dos morros. http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/848348-os-herois-estao-presos-diz-mano-brown-em-show-com-ingressos-a-r-200.shtml

Francamente, nunca entendi bem essas polêmicas artificiais, a não ser como mais um delírio ou jogada de marketing.
Ok, há sempre a contradição entre o certo e o errado à luz de prismas antagônicos. Gaddafi, por exemplo, acha que é apenas o líder da revolução e uma espécie de Deus, intocável. Lula tem quase a mesma percepção acerca de si mesmo.
Mas Mano Brown, ao subverter a ordem das coisas e polemizar ofendendo o óbvio e defendendo o obscuro, esqueceu uma coisa: bandido é bandido, de farda ou sem ela. Os herois não estão presos porque não há herois... Só o Capitão Nascimento, mas esse só existe no filme do Padilha.
Para evidenciar isso é só pedir a Mano que vá fazer um churrasco - levando a familia inteira - na penitenciária onde estão os traficantes, estupradores e toda sorte de gente boa cuja culpa pelos atos reside nos outros; nós: eu e você.
Para Mano todos eles devem ser como o Cangaceiro Severino de Aracajú, apenas mensageiros da ira de Deus, "inocentes úteis" que merecem o reino dos céus. Mas a vida aqui não é o Auto da Compadecida, de Suassuna, e se Deus utiliza desses artificios, melhor ficar bem longe dele e das hordas de aproveitadores de "inocentes úteis".

Vêm dai a idolatria aos criminosos, de toda sorte. A literatura e a arte estão carregadas disso, uma síndrome de estocolmo ampliada a qualquer crime ou criminoso. Vêm de lá também outras "peças raras" da cultura nacional que para mim não são mais que marketing de si mesmos, sempre subvertendo o statu quo apenas pra criar um outro, seu, pessoal, simétrico, porém não menos injusto.

(...)

Como em "Being John Malkovich", tentei adentrar a cabeça de Mano Brown.
Escuras ruelas, pobreza e descaso.
Eis então que vislumbro um quarto entornando ódio, de tudo, tudo o que ele não foi... mas gostaria de ter sido: rico, playboy, branco, bonito.
O resto é a receita de sempre: mágoa represada que vira ódio e faz recair a culpa exatamente em quem - no fundo - é o arquétipo de seu sonho existencial. Pau nos brancos, ricos, playboys, todos que não ele: "black is beautiful", "todo rico é lixo"(muitos são, mas nada a ver necessariamente com o dinheiro. Já eram lixo antes, mesmo se pobres), "playboy pitbull é tudo fdp" (talvez), "rap é o máximo", "quem não está comigo está contra mim".
Tudo muito simples. De uma simplicidade franciscana... e "asnica".

No filme Rapa Nui de 1994, os 'Orelhas Grandes' e os 'Orelhas Pequenas' resolveram suas diferenças e aversão mútua comendo uns aos outros ("honi soit qui mal y pense", me refiro a costumes antropofágicos). Simples...

Eu cá, como Millôr, dúvido de todos os que ficam ricos com seus "ideais".
O ingresso custava R$200, isso para que ele contasse as mazelas de sua "comunidade" e vida pobre, que aliás, caso não tivesse acontecido, teria impossibilitado sua existência como "mito" do rap nacional e capa da Rolling Stone.
Vamos mal de ídolos, muito mau!!!

Ao ver a convulsão de revoltas no mundo árabe contra todas as ditaturas "perpétuas", ao mesmo tempo em que ouço justificativas para elas de lideres como Fidel e outros ditadores não menos ditadores que Gaddafi, entendo a lógica de Mano.
A culpa das revoltas no Egito, Tunísia e Líbia é dos Estados Unidos, como quer Fidel (e talvez Chávez, Ahmadinejad, etc.). Simplicidade franciscana, de novo.
Nunca houve opressão, cerceamento das liberdades, benesses direcionadas aos acólitos e familiares, um país como filial de uma empresa pessoal, um quintal de casa. É tudo em nome do povo pobre, dos "descamisados", dos pobres de alma e inteligência.

Mano é a perfeita caricatura de um ídolo para um povo estulto, que acredita em qualquer bravata velada a pão e circo. É a luta contra o preconceito com mais preconceito. A luta contra a burrice com mais burrice, contra a violência, com mais violência.

No fundo são todos iguais. A única diferenca é que Gaddafi gosta de enfermeiras ucranianas, Fidel de charutos cubanos - por supuesto -, pitbulls de malhação, brigas e baladas, e Mano, de rap nacional (nacional???).
Já os ricos e Lula, esses gostam mesmo é de dinheiro.

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