Tenho saudade do meu pai. Mas diferente do Briguet, não me lembro dele em conversas sobre literatura, ou filosofia. Na verdade, sinto falta de nosso parlamento permeado por cacos de causos de Minas Novas, ou das impressões e reminiscências que puxava de suas aventuras e desventuras como caminhoneiro do Vale. Um diálogo absolutamente estranho aos neófitos, como se fôssemos extraterrestres, prot e seu filho do planeta K-PAX distante 1000 anos-luz da Terra, na constelação de Lira.
Até o silêncio carregado de gravidade, afinal, ambos sabíamos do hiato tudo o que estávamos a dizer um para o outro, sem emitir uma única palavra.
Foi assim até o final, muito mais dito nas pausas, olhares.
(...)
"Cai n'água"... "Nhô nhão..."
O velho me disse coisas, e não terei tempo para esquecê-las... Não viverei o suficiente para que o tempo (abusado e intrujeiro) apague minhas memórias dele... essa eu venci, por puro prognóstico clínico. Aliás, "suporte clínico" é só uma definição infame, que prefiro, essa sim!, esquecer.
Meu filho beijou-me a testa ontem à noite antes de sair para três dias de praia em Santa Catarina, na casa de um amigo. Me disse que no prédio há quadra de tênis e levou sua raquete. Anda jogando um tênis que me enche de certeza... puro prognóstico paterno. Já minha filha se enfiou num vestido curto brilhante e foi para uma balada teen com uma amiga. Muy certamente seu namoradinho da escola já a esperava por lá... mero prognóstico... cheio de ciúme. A mais velha chegou mais tarde do trabalho após ter parado no cinema... e agora me arrependo de não ter prestado atenção quando me contou sobre o filme ontem à noite, não me lembro do título enquanto escrevo essas linhas... Mas lembro-me de que tudo começou com ela, vinte e três anos atrás, e de como meu velho, embora assustado, apoiou-me incondicionalmente... fez mais, à minha revelia e conhecimento, adotou minha esposa como filha e deu a ela, mesmo nos momentos em que estivemos em lados opostos, o mesmo apoio que deu a mim. Nesse pormenor não tinha partido... que nem eu, que hoje como único partido tenho o 'partido alto', do samba, no bar Botafogo ali no Mercês. E pego de novo o fio, embora às vezes ele me pareça fundido com pedaços avulsos do presente, passado, até futuro, numa desordem calculada, numa sequência atemporal, como um todo.
Minha vida é assim, um ciclo... onde inevitavelmente volto... e acabo começando tudo de novo, e falo de meus velhos, meus filhos, de novo, e de novo... outra vez.
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