quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Homem simples


Relatei a um amigo o niilismo político que me abatera e afastava de mim esse cálice do desejo voluntário por sessões de sadomasoquismo na TV Câmara/Senado, autoimolações em nome de causas no Face (pela mais absoluta falta delas), etc. etc. etc.

Se assistira ao debate???
Precisava responder???

Eis que chego em casa e revejo o Mainardi num artigo na Folha.

Concluo envaidecido: sou também um homem simples...
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/182616-sou-marina-ate-a-posse.shtml
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Imagem: Leonardo da Vinciwww.girafamania.com.br

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Caleidoscópio


Não vi coisas que vocês nunca acreditariam. Nem naves de ataque em chamas perto da borda de Orion, nem a luz do farol cintilar no escuro na Comporta Tannhauser. 

Esses momentos perdidos no tempo como lágrimas na chuva pertenceram a Roy, o replicante que em seu momento derradeiro poupou seu algoz e caçador, Deckard, personagem protagonizado por Harrison Ford em Blade Runner, de 1982. 
O filme foi mal nas bilheterias mas virou um clássico cult, o que faz todo o sentido.

No limiar do fim Roy sabia exatamente o valor da vida, e poupou Deckard dando-lhe a chance que dele fora tirada... seguir vivendo.

Vi coisas... terras, gentes, lugares que nunca imaginei vislumbrar um dia. Não sei bem ao certo como tudo aconteceu, sei apenas que havia alguém ao meu lado a soprar-me a confiança, a petulância e coragem dos valentes. Também fui poupado, como Deckard em Blade Runner.
Não, não é muito... talvez quase nada. Mas dessas lembranças ainda pinço o dia em que me embrenhei em braçadas pelo Araçuaí, rio ardiloso depois das chuvas de Dezembro no Vale. Lembro também da fachada da casa do Zé da Toca e da "fonção" em Cachoeira à noite, para onde nos dirigimos depois da acolhida rápida em Santa Rita na casa do Zéa quem demos carona de Minas Novas no Maverick do Quilim naquele dia
E subitamente estou na Grand Place num feriado, tiro algumas fotos do carpete de flores cuidadosamente montado na praça para me perder logo depois em lembranças de Asakusa, Tóquio, e seu templo budista dedicado ao bodhisattva Kannon... um bodhisattva que personifica a caridade, caridade que o criador não teve para com Roy.

New Orleans e o beignet do Café Du Monde no French Corner, o Mississipi ao fundo a me lembrar o Araçuaí, da Toca, Cachoeira e a "fonção", a Grand Place, Asakusa, Kannon e a caridade. 
Chicago logo ali a provar que o mundo é mais que nossa perspectiva provinciana e xenófoba das coisas. New York e a neve intensa de Fevereiro ou as Ramblas em Barcelona e o Mercado La Boqueria, onde quis que o João Paixão estivesse presente, ele que é louco pelo Mercado Municipal de Belo Horizonte e por tantos outros mercados, em tantos outros lugares. 

Lembro então da última vez em que estive com meu velho no Mercado em Minas Novas. Minha mãe contou que em seu momento derradeiro, no limiar de entregar sua lucidez, ainda preocupou-se e perguntou a si mesmo: "o que eu vou fazer ?" num monólogo final.
De lá para o Sena, o Thames em London ou o Danúbio em Budapeste... O air racing no St. Stephen's Day e o mergulho dos monomotores na parte final do circuito deixando um rastro de fumaça debaixo da Chain Bridge, todos a me trazerem de novo o Araçuaí, o Mississipi, os beignets do Café Du Monde, a New Orleans do French Corner, Mardi Gras, o mercado e o carnaval em Minas Novas. O manneke pies, o d'Orsay na beira do Sena... a Mona Lisa, o Louvre. 

Luca, um italiano que conheci em Palo Alto e um link que me enviou do YouTube com um show ao vivo do PFM em 2010, o mesmo PFM do clássico Chocolate Kings que herdei sem querer do Tião. Dos chocolates que comprei na Filip Martin na Rue au Beurre próximo à Grand Place... e de novo Asakusa, o templo budista de Kannon e a caridade... caridade que Roy nem outros receberam. A Golden Gate ou um festival de verão em Viena. Mozart ou o PFM, os chocolates. O choro e a saudade do meu pai no Hotel no City Centre, a caridade de Kannon, a falta dela no criador de Roy.

A Catedral Saint-Bavon em Ghent em 2007, um dia perdido no tempo, um grito. A vela que acendi para meu irmão e outros que haviam partido.
A Igreja St. Nicholas perto da Filip Martin dos chocolates em 2014 onde rezei depois de tantos anos e pedi misericórdia... 
A Deus... Por meu pai... a meu pai... por todos nós.

"Saudade é o pior tormento..."

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Imagem: http://www.cameraviajante.com.br/caleidoscopio.html