Causa e efeito sempre foram tara científica. Em ciência, causalidade é mantra comum embasado por modelos matemáticos que vão da Indução à Teoria do Caos. A certeza de que derrubado um dominó os colocados a sua frente cairão em sequência é senso comum. Dai para o Efeito Borboleta de Lorenz em seu Deterministic Nonperiodic Flow, nada mais que algumas centenas de anos. No Universo Imperfeito, pontuaria Marcelo Gleiser, a sopa prebiótica que nos trouxe até aqui teria sido consequência da conjunção (quase) aleatória e raríssima de um sem-número de condições que culminariam no aparecimento do primeiro ser unicelular. Somos a singularidade, portanto, o atrator perdido na vastidão solitária do universo em meio ao caos.
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Sociólogos, cientistas políticos, advogados progressistas - todos adeptos do ofício criativo - só usam e abusam da causalidade, no entanto, caso útil a seus intentos ideológicos. Não se trata de um imperativo científico, pelo contrário, mero estratagema erístico no intuito de burlar a verdade prestando à mentira um pseudo rigor. A lógica, outra espinha dorsal do método, também estuprada coletivamente todas as vezes que algum descalabro necessita de explicação retórica. O "não sabia de nada", "só uma consequência da falta de oportunidade", "culpa do sistema" e tantas outras excrecências que procriam no discurso picareta da defesa dos indefensáveis, pululam na imprensa oficiosa desses dias como uma infestação de baratas. A última, a mais recente pedra de toque para o embate jurídico em direção ao perdão de organizações, crimes e criminosos. É como se na bacia das almas, tirando nós, expectadores atônitos, os atores do picadeiro desempenhassem seus papéis desplugados da responsabilidade pelo roteiro macabro da farsa, e pior, não dando a mínima para quem pagou o ingresso. E a massa de manobra, cuja extensão cultural limita-se às redes sociais e protestos a favor, a repetir como papagaios de pirata os jargões cunhados pelos marqueteiros ou think tanks sem nem mesmo um mínimo de pudor na apuração dos fatos. Loas ao feio como se bonito fosse ecoam do meio do teatro para surpresa dos incautos. Palavras-gatilho e o rosário de verdades superficiais que desfiam como justificativas autoevidentes além de apócrifos e toda sorte de lixo circulam na net avalizando a matemática do efeito dominó. Todos também atores de um espetáculo patético onde qualquer tentativa de debate torna-se-ia inútil. É como rezar as Catilinárias de Cicero para os pombos na praça.
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Sem esperança à vista, cabisbaixo, acompanhado por um niilismo que leva meus olhos de volta ao passado a minha frente, leio alguns capítulos do Homem Medíocre de Ingenieros, ouço Tales of Topographic Oceans do Yes ou Tarkus do ELP, revejo Matrix e enterro-me novamente em meu silêncio, embora andasse com saudade de rascunhar umas linhas.
Tomara não dure mais oito meses...